Coletivo Ana Montenegro

quarta-feira, 25 de junho de 2014

3ª Marcha das Vadias- Aracajú-SE


3ª MARCHA DAS VADIAS- ARACAJU: O diálogo entre feminismo e transfeminismo


Pela terceira vez na capital sergipana ocorreu a Marcha das Vadias. Dessa vez o destaque da marcha foi a pauta da transfobia: opressão contra as pessoas transexuais e travestis. Esta centralidade na pauta é produto de um diálogo que o movimento feminista de esquerda travou com o transfeminista, do qual trouxe valiosas contribuições como, por exemplos, a diferença entre identidades de gênero e orientação sexual; pelo direito da visibilidade trans* e a reivindicação do projeto de lei denominado Lei João W. Nery - a Lei de Identidade de Gênero Brasileira.
Esse diálogo significa um marco para ambos os movimentos, uma vez que historicamente as divergências de concepção de gênero e de fazer política os afastaram de uma possível unidade. Isto porque, por muito tempo o movimento feminista sustentou uma (falsa) tese de biologização do conceito de mulher e homem, isto é, dava- se certa primazia a genitália como definição. Assim, os traços anatômicos (vagina ou pênis) eram o que definia tanto os papeis sociais como também a própria inserção no movimento feminista. Portanto, bastava- se ter vagina para, assim, ser considerada mulher e até mesmo feminista.
Com o advento das manifestações de ordem LGBT na década de 60- 70 e a chegada impactante da obra “O Segundo Sexo” (1949) de Simone de Beauvoir no movimento feminista da época é que se passou a questionar “o que é ser mulher”? O livro da Beauvoir influenciou de forma decisiva o movimento feminista, pois trouxe a desconstrução do mito de uma essência feminina a partir do seu sexo, quando na verdade era uma camuflagem da dominação masculina.
A partir da década de 60, o movimento feminista ganha nova roupagem ao adicionar em seus princípios − consequentemente nas suas frentes de luta − a necessidade de questionamento e desconstrução das raízes culturais da desigualdade entre os sexos. Colocando em xeque a ideologia machista dominante do ‘eterno feminino’, na qual afirmava que mulher está destinada ao lar e a família, por ser o sexo frágil e inferior ao homem. Deste modo, o movimento feminista pautou por mudanças nos costumes e na quebra dessa assimetria que justifica a dominação masculina. Portanto, a bandeira reivindicatória era de que não bastava ter útero era preciso tornar- se mulher! Afinal, “a mulher não se define nem por hormônios nem por misteriosos instintos e sim pela maneira por que reassume seu corpo e sua relação com o mundo." (Beauvoir, 1967, p: 494).
Embora já se tenha passado algumas décadas desse avanço, que foi o surgimento da categoria gênero enquanto construção social, muitos movimentos feministas ainda trazem em suas diretrizes políticas a não aceitação dxs transexuais e das travestis nos seus espaços de auto- organização e de atuação política. Isso, para nós do Coletivo Feminista- Classista Ana Montenegro é estéril e que pode nos conduzir ao fundamentalismo da biologização do conceito de gênero. E coloca-se em risco de essencializar uma categoria que veio desconstruir essências!
É preciso avançar e não retroceder! E entender que, assim como gênero não se resume a genitália, feminismo não se resume a útero. Continuemos a enunciar a célebre frase da Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher: torna-se” e sigamos em Marcha até que sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres.
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Créditos da foto: Janaína Vasconcelos
Referência Bibliográfica:
BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo. Vol. II. Editora Difusão europeia do livro. 1967

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